Terça-feira, 16 de Junho de 2009
ERROS MÉDICOS
Quando se fala em erro médico, a primeira imagem que vem à mente é a do cirurgião que esquece o bisturi dentro do corpo do paciente ou que extrai um órgão errado. Mas os erros nem sempre são tão espetaculares, ainda que possam causar muito estrago. E estão aumentando, numa aparente contradição com o avanço da tecnologia médica. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) recebeu, em 1995, 1.509 denúncias de erros. Em 2005, o número de erros médicos pulou para 3.660, um aumento de quase 150%.
As falhas nos laboratórios de patologia clínica, onde milhões de exames são processados todo dia, ou nos centros de diagnóstico por imagem, onde erros de leitura e interpretação de uma tomografia ou de uma ressonância magnética podem levar a resultados enganosos e conseqüências desastrosas para os pacientes.
Não se sabe precisar quantos erros desse tipo acontecem por ano no Brasil. A maior parte, felizmente, não causa danos graves e nunca será identificada. Mesmo assim, uma pesquisa do Cremesp mostra que laboratórios apareceram como réus em 1 a cada 30 processos com alegação de erros médicos julgados nos tribunais paulistas em 2004. E o bioquímico Humberto Tibúrcio, autor do livro Ações Civis de Danos Morais Contra Laboratórios Clínicos, localizou 1.508 processos por erros em exames laboratoriais entre 2000 e novembro de 2007, numa pesquisa nacional.
Os erros podem ocorrer na identificação (ao etiquetar amostras ou inserir dados incorretos do paciente nos sistemas de computação do laboratório) e até na redação do laudo.
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Caso Verídico. *
Há dez anos, Márcia Carvalho, de 41 anos, acompanhada da irmã, entrou no consultório médico do ginecologista. Aquela tarde de agosto iria mudar sua vida. Dias antes, sentindo dores no lado esquerdo do abdome, a funcionária da Secretaria de Saúde de Contagem (MG) havia estado no mesmo consultório e saído com um pedido de exame. A ultra-sonografia revelou um cisto no ovário, que poderia ser retirado por meio de punção, sem cirurgia. O material foi colhido por esse procedimento em uma clínica e encaminhado a um laboratório da capital mineira. Márcia então levou o laudo ao médico. Dessa vez, o que ouviu não poderia ser mais assustador: câncer.
A notícia deixou Márcia atordoada e ela perguntou se não poderia ter havido um erro. O médico garantiu que era muito difícil ocorrer erro num exame de ultra-sonografia. “Ele disse que eu tinha de operar imediatamente, pois o laudo indicava que meu quadro era muito grave”, conta ela, que, trêmula e suando frio, já saiu da clínica com os pedidos de exames pré-operatórios.
“Os dias que antecederam a operação foram os mais difíceis da minha vida. Eu não conseguia dormir. Meus amigos e meus irmãos vinham me visitar e, vendo meu estado, começavam a chorar, esperando o pior”, lembra Márcia.
A cirurgia durou quatro horas. No fim da tarde, ainda grogue por causa da anestesia, a paciente recebeu da própria cirurgiã uma notícia surpreendente: a operação tinha sido desnecessária. Não havia tumor em seus ovários. Márcia não tinha e nunca teve câncer. “Quando ouvi isso, fiquei muito confusa, num misto de alegria e tristeza. Além da dor, eu sentia um mal-estar terrível.
”Tão logo se restabeleceu e pôde voltar à vida normal, Márcia processou por danos morais e materiais o laboratório, que atribuiu o erro à imperfeição da ciência. Ela venceu em duas instâncias e recebe em parcelas uma indenização no valor de R$ 85 mil. “Fiquei meses sem trabalhar, tenho de tomar remédios diariamente, inclusive para reposição hormonal, e ainda sinto dores no local da cirurgia”, conta a funcionária pública.
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Quais são os problemas causados por erros médicos? *
Os problemas vão do estresse e ansiedade causados pelo resultado incorreto a conseqüências mais perigosas, embora menos comuns, como atraso no tratamento, transfusões com o tipo sanguíneo errado e até uma cirurgia desnecessária.
Há uma evidente falta de preparo dos médicos. As faculdades se multiplicaram, mas a maior parte delas não garante boa formação. E pior: vejo exames assinados por técnicos, para que os laboratórios ganhem com a redução dos custos”, admite o conselheiro do Cremesp, Reinaldo Ayer de Oliveira.
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Diagnósticos de Aids – Falsos *
As conseqüências podem ser horríveis quando se trata de exames para o diagnóstico de doenças graves como câncer e Aids. “São muitas as ações judiciais propostas por pessoas que tiveram diagnósticos errados de Aids”, afirma o médico Juan Carlos Raxach, assessor de projetos da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS.
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A qualidade das mamografias no Brasil permanece um caso à parte. E alarmante, principalmente se lembrarmos que o câncer de mama é o que mais atinge as mulheres brasileiras.
Com a crescente diversificação e modernização dos exames de imagem, os radiologistas que executam e analisam esses exames – dos modestos raios X ao moderno Pet Scan (tomografia de emissão positrônica) – são participantes ativos nos processos de diagnóstico. E quando eles cometem um erro é o paciente quem paga – e isso pode sair bem caro.
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Onde está o erro em exames médicos? *
Nos exames por imagem existem três estágios principais em que podem acontecer erros:
.Reconhecimento da anormalidade,
.Diagnóstico
.Comunicação do resultado ao médico e ao paciente.
Mário Mourão Netto, diretor do Departamento de Mastologia do Hospital do Câncer, em São Paulo, confirma a cada dia a importância de se acertar um diagnóstico de primeira e de observar a qualidade da mamografia, a procedência e o radiologista que emite o laudo. Ele cita o caso recente de uma paciente que trouxe uma mamografia de três anos antes em que o tumor já era visível. “Agora o prognóstico é outro; a cirurgia é mais invasiva, são mais sessões de quimioterapia e radioterapia.” O mastologista acha inaceitável que um médico leia apenas o laudo do radiologista, sem observar as imagens. “Mas é o que muitos fazem.”
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Procure médicos especializados *
Pelo Dr. Marcelo Guerra “Sou médico e psicoterapeuta e, como costuma acontecer com alguns profissionais de saúde, ao verificar que estava com febre, disse à minha mulher: “Isso não é nada... Vai passar.” Mas, depois de quatro dias, a febre não passava e a garganta começou a inchar. Então fui ao hospital na cidade onde moro, Nova Friburgo (RJ). Ali, depois de um rápido exame, o médico de plantão perguntou se eu apresentava algum sangramento. Lembrei da minha gengiva, que sangrava há alguns dias. O colega, então, me deu o diagnóstico: dengue hemorrágica .
Aquilo me deixou assustado. Mas, como não queria misturar minha condição de médico com a de paciente, e como o colega que me atendeu se mostrou convicto, não refutei. Afastei-me do trabalho para observar a evolução dos sintomas e comuniquei à família que estava com uma doença grave, talvez fatal. Foi um período de muita angústia. Depois de uns dez dias, os sintomas começaram a regredir. Voltei ao hospital e outro médico me atendeu, percebendo que eu não sofria de nada além de uma forte infecção na garganta e de uma gengivite, inflamação muito comum e, de modo algum, fatal. Tomei antibióticos e em uma semana voltei ao trabalho.
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Como agir ao receber um diagnóstico de doença grave. *
Mesmo não sendo um leigo em medicina, eu não quis confrontar o médico que me deu um diagnóstico tão drástico e precipitado. Fico imaginando a dificuldade de um paciente comum. É fundamental buscar esclarecimentos para tomar as decisões sobre a própria saúde. Meus conselhos:
.Pergunte tudo ao seu médico até entender a doença e tratamento por completo.
.Escolha bem o seu médico e a equipe que o atenderá durante o tratamento.
.Leia a etiqueta de exames de laboratório e repita o exame quantas vezes for necessário (Mas não exagere nos exames -Uma segunda opinião de um outro médico pode ser a salvação. Outra visão sobre o diagnóstico e o tratamento é indispensável).
.Leve a ficha médica em todas as consultas e exames.
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